ANESTESIA DA FÉ -
Pe. Jerônimo Gasques (13.11.2012)
Estamos
anestesiados! Acobardados. Assustados. Espantados. Alarmados...
O que é
anestesia? É aquela injeção que você recebe para não sentir dor alguma e que o
mau não lhe faça mal. Ou a medicina responde:
“Anestesia é o
estado de total ausência de dor e outras sensações durante uma operação, exame
diagnóstico ou curativo. Ela pode ser geral, isto é, para o corpo todo; ou
parcial, também chamada regional, quando apenas uma região do corpo é
anestesiada. Sob o efeito de uma anestesia geral, você dorme. Com anestesia
regional você pode ficar dormindo ou acordado, conforme a conveniência, embora
parte de seu corpo fique anestesiada”.
A anestesia é um
sintoma de indecisão total diante de fatos irrecusáveis. Vemos, mas não
queremos reagir ou, talvez, não tenhamos forças, pois estamos anestesiados. Há
dormência por todo o corpo, especialmente no Corpo Místico de Jesus. Relegamos
ao sintoma nossas carências, medos e ausências.
A anestesia nos
protege diante das perguntas e ficamos de boca aberta sem saber o que
responder. A indecisão contraria a fé. Imaginem Abraão indeciso diante de Deus.
De Maria diante da proposta do anjo. De José diante do sonho. De Davi,
Jeremias, Dorothy...
Quando estamos
decididos, temos que enfrentar as consequências; sem enfrentamento não existe
vitória. Sobram elucubrações, pensamos com exagero, sem chegar a nenhuma
definição. A indecisão interrompe a caminhada da vida. Corta o fio de esperança
e mutila os servos de Deus.
A
anestesia está contaminando as comunidades e as Igrejas. A anestesia espiritual
domina nossas emoções e nos tornamos insensíveis às dores humanas; não sentimos
mais o clamor dos pobres e ficamos indiferentes às esmolas. Os esmolantes são
uma profecia de que algo está errado entre os filhos de Deus. Deus nos fez no
Paraíso e não com a sacola estendida para clamar a piedade dos transeuntes.
Hoje
se reza muito e age-se tão pouco. Tem gente que se preocupa em comungar de
joelhos enquanto o irmão vive na lama e no charco da prostituição e das drogas.
Aliciamos a juventude com os entorpecentes de uma religião falsa e oramos em
línguas enquanto não entendemos o clamor dos miseráveis.
Hoje
muita gente diz ver Maria, mas não se digna de ver Jesus nos irmãos. Que
contradição. Que barbaridades fizeram com a fé. A fé virou apenas um enfeite
para se exibir.
Vivemos
buscando milagres e curas; promovemos missas e cultos de libertação enquanto o
povo vive abandonado sem religião e sem uma nova evangelização que promova a
vida em plenitude. Ainda, alguns têm a ilusão que salvarão o mundo a partir da
religião.
Criamos
grupos de oração e nos recusamos em formar grupo de libertação das garras de
Satanás. Somos prisioneiros de pregadores que apresentam um Cristo bonzinho e
cheio de virtudes (não que não as tivesse), mas que não se digna olhar os
leprosos, cegos e outros adoecidos sem atendimento médico e hospitalar.
Ficamos
anestesiados quando vemos certos padres de batina e com toda a tralha própria
de alguém que se esqueceu do tempo e vive buscando conforto no passado
distante. Vivem sonhando com o que era, embora não tenham consciência do agora.
Apenas para confortar os inconformados com a nova doutrina da Igreja.
Revestem-se do poder para oprimir e se distanciarem do povo. Disfarçam-se de
bonzinhos!
Anestesiados
com o pecado, não vemos mais nada diferente. Contentamo-nos com é isso mesmo. O
que fazer? Anestesiados com a felicidade alheia, nos extasiamos diante do
desejo que fala mais alto. Somos conduzidos ao simulacro de um novo tempo de um
Deus distante e protegido pelos herdeiros do conformismo, como se Deus
necessitasse deles para sobreviver. Tal é a sanha desses imbecis!
A
dose da anestesia é tamanha que nos faz “endorfinados” diante dos pobres. Eles
parecem não existir, apenas uma sombra; nem se lembram mais deles. Ficaram no
esquecimento, no lúgubre espaço dos porões das sacristias.
A
anestesia fez de nossas homilias um espaço de vaidade humana. Um comício onde
as palmas e ovações são constantes. O celebrante virou uma espécie de super
star onde somente ele pode aparecer e o Cristo humilde, homem da cruz, fica à
espera de sua vez na longa fila dos simples e desprezados.
As
palmas não são mais para Jesus; são aclamações dos milagres operados pelos teatrólogos
dos palcos ilunimados com os holofotes da vaidade humana. Vertem-se lágrimas de
consolo enquanto a consciência social fica prisioneira de alguns opositores.
Nesse palco a cena é simplesmente de alguns privilegiados. O clube dos
assistidos ensaia o novo formato de show onde os mesmos voltarão a brilhar!
As
orações são ungidas, embora não se saiba de que e nem se entende o que seja
isso, mas é costume dizer. Todos dizem assim e os da fila, entorpecidos,
recitam a mesma ladainha nos megafones da consciência. É a voz do espírito!
Oram com unções provindas do além e dizem que é bíblico! Se Satanás fosse
chocarreiro não teria tentado a Jesus! “Um pouco de ciência nos afasta de Deus.
Muito, nos aproxima” (L. Pasteur).
Para
dar suporte a esse espetáculo as televisões e rádios dão a cobertura e afirmam
que se Jesus estivesse por aqui faria a mesma coisa. Vejam o grau de petulância
e de vaidade humana ao se compararem com Jesus, o virtuoso e mártir da Nazaré.
Suspiro
para que passe logo o efeito da anestesia e façamos a revolução do amor. Só um
amor engajado, livre, sadio, cristão poderá salvar a Igreja e o mundo de tanta
indiferença. Estamos morrendo por sonolência, de distância, de crença em
pessoas e figuras humanas.
A síntese da fé
cristã ensinada por Jesus de Nazaré: “Não existe amor maior do que dar a vida
pelos amigos” (Jo 15,13).
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